Por Taninos e Afins
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Alunos do IFSP campus São Roque com Daniel Grohs (ao centro, de barba), coordenador do curso |
Uma boa produção de uva começa com mudas de qualidade. Foi pensando nisso que, há cerca de sete anos, a Embrapa Uva e Vinho, cuja sede fica em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, desenvolveu treinamento para capacitar viveiristas de videira. Nos últimos dias 24 e 25 de setembro, a empresa de pesquisa na área agropecuária, vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), realizou a 3ª Edição do Encontro para Capacitação de Viveiristas de Videira. Seis graduandos do curso de Tecnologia em Viticultura e Enologia (TVE) do Instituto Federal de São Paulo, campus São Roque (IFSP São Roque), participaram da iniciativa.
Misturando
aulas práticas e teóricas, que abordaram temas diversos como fisiologia vegetal, propagação, substratos, entomologia, doenças do tronco, entre outros, o terceiro encontro teve mais inscritos que vagas
ofertadas, uma prova de que o tema tem ganhado relevância no mercado nacional. Entre
os palestrantes, estiveram pesquisadores da Embrapa Uva e Vinho, uma referência
no setor, além de professores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e do
Instituto Federal de Bento. O curso atraiu público de todo o Brasil, desde
Rondônia, Tocantins, Petrolina, Goiás, São Paulo, Brasília, entre outros.
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O encontro de viveiristas foi realizado em Bento Gonçalves |
“O
curso superou nossas expectativas. Esta é a terceira edição. Em geral, realizamos
a cada dois anos e a previsão era de que fizéssemos em 2020, mas tivemos que
adiantar”, disse o pesquisador da Embrapa Uva e Vinho e coordenador do curso,
Daniel Santos Grohs.
Diante
da procura, a cota de 50 pessoas por edição foi superada e, na versão deste
ano, abriu-se uma exceção, permitindo a presença de cerca de 70 pessoas.
Segundo Grohs, isso se deve ao fato de que a vitivinicultura está extrapolando
as fronteiras do Rio Grande do Sul, atualmente o maior produtor do país.
“Estamos
vendo que há demanda para cima (regiões centrais do país) e, ao final, precisamos
sentar e pensar em como faremos a sustentabilidade do negócio”, disse.
Com
o crescimento do mercado de uva, vinho e derivados para outras regiões do país,
a Embrapa Uva e Vinho trabalha com a expectativa de uma demanda cada vez mais
crescente e intermitente de mudas de uva e, se nada for feito até lá, poderá
haver um déficit no mercado. Hoje, os viveiristas não dão conta de atender a
essa demanda imediatamente, sendo que trabalham com pedidos antecipados em até um ano.
Grosso
modo, o programa da Embrapa Uva e Vinho funciona da seguinte maneira: o
viveirista cadastrado recebe mudas com qualidade sanitária contra os principais
vírus da videira (é garantida a limpeza de seis grupos virais). Os viveiristas
credenciados podem replicá-las e vendê-las no mercado, desde que paguem 5% de
royalties sobre as mudas comercializadas à Embrapa. Há, no entanto, um limite
de seis replicações sobre mudas in vitro, enquanto não há limite para as
demais. Periodicamente, a Embrapa acompanha a sanidade das plantas básicas
adquiridas.
Atualmente,
há 12 viveiristas licenciados, sendo sete somente no Rio
Grande do Sul e os demais em Minas Gerais, Bahia, Pernambuco e Santa Catarina.
Só os do Rio Grande comercializam 2,5 milhões e os de Petrolina, quatro
milhões, pois estes últimos conseguem obter mais efetividade na replicação das mudas devido às
características edafoclimáticas da região.
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Evento incluiu atividades teóricas e de campo |
Tendo-se
a experiência, o primeiro passo é inscrever-se no Renasem (Registro Nacional de
Sementes e Mudas) e, obtendo-se ele, pode-se procurar a Embrapa Uva e Vinho.
Graduandos de TVE
Seis alunos do curso de Viticultura e Enologia participaram do curso (aliás, os únicos participantes de institutos federais. A exceção foi um bolsista da Embrapa do IF de Bento, que esteve no primeiro dia) e todos tiveram impressões muito positivas da iniciativa, especialmente por terem tido a oportunidade de ter contato com o mundo real das mudas de videira.
A
aluna do segundo semestre, a biomédica Gabriela Hirschfeld-Campolongo, classificou
o treinamento como “bastante interessante, pois houve muito fundamento técnico-científico
eu não tinha expectativa de que seria tão profundamente científico".
Para
ela, esse aspecto foi uma boa surpresa, além do contato com pessoas de diversas
regiões, que não somente o Sul ou Petrolina, o que mostra que há uma dispersão
de interessados no cultivo de mudas de videira.
“A
Embrapa Uva e Vinho tem uma estrutura bem equipada e isso dá a possibilidade de
expandir a pesquisa, o que, infelizmente, não temos a possibilidade de fazer no
IFSP”, salientou.
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Replicação de mudas in vitro da Embrapa Uva e Vinho |
A
aluna do quarto período Isabella Magalhães apontou que o curso complementou bastante
as aulas de Fisiologia Vegetal e Fitopatologia, ministradas pelo professor
Flávio Trevisan, além de ter-lhe dado uma noção de como é ser um viveirista. “Aqui
a gente convive com viveiristas e, por isso, consegue ter uma visão do que é
prático na verdade, do que funciona e dos valores envolvidos, e isso é muito
importante para a gente.”
O
engenheiro agrônomo, vitivinicultor e aluno do sexto período André Sano
acredita que o que se viu no curso é o que realmente é aplicado no mercado. “Normalmente
na universidade a gente não consegue chegar a um padrão de como se faz as
coisas e aqui nós temos contato com esse padrão, que é o padrão Embrapa de
qualidade e, a partir desse contato, vemos se vale a pena ser um viveirista ou
não”, pontuou.
Na
mesma linha de raciocínio, o aluno do quarto período João Góes também apontou
que o treinamento da Embrapa mostra o padrão de produção da empresa, bem como
as noções das exigências da legislação. “As primeiras palestras foram um
complemento das aulas do Flávio, mas a parte prática é bem diferente. Aqui
tivemos a noção prática do negócio”, salientou.
O
também aluno do quarto período Fernando Barbosa Santos disse que algumas das palestras
corresponderam a um aprofundamento do que se viu em sala de aula no IFSP. “O
curso acrescentou bastante, especialmente a parte prática, que deu um plus
sobre outras maneiras de se fazer enxertia.”
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Pesquisador ensina a fazer enxertia verde |
“Obviamente
há limitações no curso do IFSP e creio que seja esse mesmo o papel da academia:
ela dá ao aluno as ferramentas de que ele necessita, incitando-lhe a curiosidade
para que busque fora do campus novas informações. O mundo real é mesmo muito diferente
do mundo acadêmico.”
Além
disso, o curso, para ela, foi surpreendente no sentido de não só conhecer sobre o cultivo de mudas, mas de perceber que o universo da uva e do vinho ainda é
bastante incipiente no Brasil. “A quantidade de interessados nos mostrou que há
muita gente apostando nesse setor e em regiões as quais sequer imaginávamos, o que é muito bom para nós, estudantes de
viticultura e enologia”, pontuou.
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Câmara de pegamento de enxertia |